domingo, 26 de setembro de 2010

Eterno Domingo

Virando a esquina ela já percebeu algo diferente. Seus lábios ainda sentiam os dele e seu cheiro ainda estava no ar, ali dentro do seu carro, dentro dela. E na rua seguinte ela sentiu algo que até então era apenas uma idéia: ele chegara, definitivamente, ele estava aqui.

Mas, como não poderia deixar de ser, continuou seu caminho, indo para algum lugar que não lhe lembrasse quem ele era, um lugar que possuía toda a imensidão de quem ela era, um lugar em que ele não existe e nunca existiu. No caminho, ainda conseguia sentir toda aquela leveza, mas a deixava um pouco para trás a cada quilômetro rodado, a cada brisa que batia no seu rosto, com o mesmo carinho com que ele o fazia. E no farol, desconectada do seu destino e das suas ações já automáticas de ir e vir, sua memória lhe trazia as horas daquele dia, que ficavam mais distantes a medida que o sol ia sumindo no horizonte.

Ela estava parada há muito tempo, muito mais tempo do que gostaria, mais tempo do que havia se dado conta. Ela ficara parada, sem perceber o quanto havia feito, o quanto havia andado. Em círculos. Nada lhe fez sair do confortável local em que ficara durante a última década. Agora ela queria ser mais, tão mais, queria ser o que sempre sonhou, queria ter novos sonhos, novos destinos, novas lembranças.

Gostaria de se movimentar como os pássaros, voar por aí, sentir gostos diferentes, esperar a chuva cair, inundando sua vida sem pedir licença. Sentia vontade agora de acordar cedo e dormir tarde para não perder um momento sequer. Até então estava sem ação, seguindo a inércia da vida nessa metrópole que a movimentava involuntariamente por suas vielas, ruas e avenidas, por suas calçadas, seu trânsito. Seu transe.

Finalmente se movimentava. Um pouco por inércia ainda, mas definitivamente estava em movimento, mesmo sem saber para onde ia, ela tinha uma certeza: ele chegara. E ela fingia que ainda não havia se dado conta da liberdade de poder sentir. Aos poucos foi diminuindo a velocidade, estacionou o carro e andou até a porta da sua casa. Era noite, mas para ela aquele dia nunca terminaria. 

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